Que contém essa grande zona de
desconhecido?
Eis o que é preciso saber. Na vida,
inclusive para alcançar êxito em nosso mundo atual, necessitamos de mais bom
senso e sabedoria. A força, em que hoje tanto se acredita, se não a soubermos
guiar, a ninguém servirá, reduzindo-se a estúpida e violenta manifestação de um
bruto: extermínio inconcludente. Quantas coisas imprevistas estão de emboscada,
no bem ou no mal, como alegria ou dor, nesse imponderável que, embora no
mistério, conduz tão grande parte de nossa vida! Ao lado da zona bem definida,
formada de coisas por nós mesmos desejadas, que vasto campo em que preponderam
o que chamamos circunstâncias, surpresa, sorte, desgraça! A maioria, ignara e
simplista, atribui todas essas coisas, em peso, ao acaso. Ora, quem diz acaso
revela a própria ignorância. A quem sonda nas profundezas, porém, a estrutura
da vida parece bem diferente. Uma ausência de normas e de guia, um
funcionamento sem lei, confiado totalmente à desordem - é um absurdo. A
direção, que é ato positivo, não poderia ser confiada a um elemento negativo,
que não se sustém por si mesmo e que só existe como contraposto. A negação da
ordem não pode ter a força de sustentar a perene afirmação criativa da vida.
Como o nada não existe senão como condição do ser, igualmente o acaso só é
consebível como desordem enquadrada em função de uma ordem mais vasta, que o
circunscreve e o conduz, em ordem, para superiores objetivos. Tudo no universo, inclusive o que aparenta
fugir à disciplina e parece casual, é regulado por normas e cada força se move,
por concatenação, objetivando uma precisa finalidade, segundo o princípio de
causa e efeito. Também onde as forças surgem ainda em estado caótico,
caracterizando fases mais involuídas, o pensamento e a vontade de Deus, íntima
e ocultamente, detêm as rédeas e governam o caos. É somente por essa razão que
esse caos não se transforma numa dança infernal de forças inimigas e não se
dissipa no nada, mas, gradualmente evolui, disciplinando-se numa ordem em que
cada vez mais evidente se manifesta a presença de Deus. O imponderável não é,
pois, o acaso ou uma desordem e, sim, uma ordem que não conhecemos.O problema
consiste, assim, em penetrar a lei desse funcionamento, de nós desconhecido.
Que significa a vida de um homem?
Não é, certamente, um fenômeno estático: é um feixe de forças em movimento. Em
face do princípio de causalidade, o problema é conhecer o caráter de cada uma
dessas forças, quais são atualmente, o caminho que elas percorreram até hoje.
Só assim poderemos determinar o que serão elas amanhã. Trata-se de nos
conhecermos a nós mesmos, de conhecer a personalidade humana em geral e,
depois, nosso próprio caso particular. O homem moderno não conhece nem uma nem
outra coisa. Não é fácil, porquanto são muitos os elementos: são impulsos
recentes, outros distantes, outros remotíssimos, de natureza e poder
diferentes, e sempre em contínuo movimento e desenvolvimento. São forças nossas
e alheias entrelaçadas por uma contínua interdependência de ação e reação; são
forças já solidificadas em determinismo, fixadas por longas repetições de atos
em automatismos e instintos, e forças ainda livres, em formação, que apenas
começam a fazer parte do feixe dinâmico que constitui a personalidade humana,
forças ainda fluídicas, não cristalizadas no destino, e que continuamente
produzimos. Como nos orientarmos?O universo é, entretanto, indubitavelmente,
uma grande orquestração de forças, um imenso concerto, em que também o homem
emite sua nota, mais ou menos consciente, mais ou menos livre, conforme sua
evolução e vontade. Cada ato, cada dia, cada vida segue e sobrevem, uma após
outra, como ondas de um oceano sem fim. Tudo é conexo no espaço e no tempo, e
tudo avança na grande marcha ascensional da evolução para Deus, para os
objetivos pessoais, para mais vastos escopos coletivos, numa hierarquia de
finalidades orientadas todas para um único centro: Deus.
Se o homem conhecesse todos esses
elementos que se encontram nele e em torno dele, sem dúvida conheceria seu
futuro. O conceito de acaso, de caos e de desordem não pode existir senão na
forma mental do involuído. Só nos graus de evolução superior à humana se pode
ter a capacidade de abranger tão vastos panoramas, que estão providencialmente
escondidos ao homem atual, em face de seus baixos instintos. Assim, atualmente,
para ele, tudo o que está fora do seu reduzido campo de exercitação, que lhe é
necessário para progredir, tudo se confunde num inextricável emaranhado que o
deixa em trevas profundas. Eis porque a palavra "imponderável" não
pode assumir senão um significado negativo, de desconhecido e incognoscível,
quando, na realidade, possui um conteúdo positivo e precisamente definível.
Para atingir este conteúdo, todavia, é
necessário ainda evoluir, distanciando-se do atual estado de animalidade. O
homem de nossos dias não pode compreender isso, porquanto se encontra dentro
desse estado e é ele sua forma mental; e um estado não se pode perceber quando
se está dentro dele, mas, sim quando se está fora dele ou dele se afasta. O
homem atual navega num mar de incógnitas, em que a direção dos acontecimentos,
individuais ou coletivos, não lhe pode ser confiada, porque ele é um cego, mas
é mantida pela sabedoria das leis de Deus. Entretanto, para que lhe seja
possível evoluir, através de uma livre experiência, por forma consciente e
responsável, um pequenino raio de luz lhe foi deixado, suficiente para lhe
iluminar a estrada a percorrer. Aí ele compreende, escolhe, semeia e ceifa,
erra e paga, sofre a reação das forças que possui e que somente ele mesmo pode
movimentar. Quanto ao resto, nada sabe e nada pode, tudo é determinismo, acima
de seu poder e conhecimento e, portanto, também responsabilidade. Não lhe resta
senão entregar-se a Deus e à Sua sabedoria.
Ao homem foram confiados um determinado
dever e um pequeno campo para lavrar, que é o seu planeta; só como simples
espectador pode ele contemplar a direção do universo, nos limites de sua
compreensão. Realizado o seu trabalho no âmbito estabelecido pela lei de Deus,
para sua própria edificação, o resto pertence ao próprio Deus, que distribuirá
infinitas tarefas a quem e a quantos quiser. Cumprido seu dever, ao homem não
resta senão confiar no "Pai Celestial", que já demonstrou saber tão
bem dirigir o universo, trazendo-o até aqui, vivo e esplendoroso, qual o vemos,
trabalhando antes do homem e sem auxílio dele. Quando, pois, o homem errar, que
aceite de Deus a justa correção; e quando souber adaptar-se à Sua ordem, Dele
aceite a justa recompensa.
Quando falamos sobre um imponderável
conhecível, referimo-nos às incógnitas relativas ao homem e ao seu ambiente e
também às do universo, que neles se refletem. Se quisermos sondar o
imponderável que mais nos interessa, o mais próximo, relativo à nossa
personalidade, maior é a possibilidade de conhecê-lo. Com o cálculo das
probabilidades já se tem experimentado estabelecer a lei que regula o curso dos
acontecimentos. Esse cálculo, porém, se refere às formas mais simples e é uma
abstração bem longe de corresponder à realidade. Nos eventos humanos os
elementos constitutivos são tantos e em tão grande parte desconhecidos, que
aquele cálculo falha completamente ao seu escopo. Se reduzirmos, no entanto, o
complexo feixe de forças que constituem um destino à sua expressão mais
simples, isto é, forças favoráveis ou contrárias, poderemos ter uma idéia do
seu provável desenvolvimento, numa determinada vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário