O termo Neoplasticismo refere-se
ao movimento artístico de vanguarda capitaneado pela figura de Piet Mondrian,
relacionado à arte abstrata.O Neoplasticismo defendia uma
total limpeza espacial para a pintura, reduzindo-a a seus elementos mais puros
e buscando suas características mais próprias. Muitos de seus ideais foram
expostos na revista De Stijl (O Estilo).
A necessidade de ressaltar o
aspecto artificial da arte (criação humana) fez com que os artistas deste
movimento (notadamente Mondrian e Theo van Doesburg) usassem apenas as cores
primárias (vermelho, amarelo, azul) em seu estado máximo de saturação (artificial),
assim como o branco e o preto (inexistentes na Natureza, o primeiro sendo
presença total e o segundo ausência total de luz).
Claramente um movimento de arte
de pesquisa, os experimentos realizados pelos artistas neoplásticos foram
essenciais para a arquitetura moderna, assim como para a formulação do que hoje
se conhece por design. Apesar de afastados da Bauhaus devido a questões
pontuais, ambos os movimentos fazem parte de um mesmo universo cultural.
Embora muitos vejam o
Neo-Plasticismo como produto da revolta moral contra a violência irracional que
assolava a Europa, alguns outros fatores foram essenciais para o nascimento do
movimento, como o cubismo, que desfigurou os modos tradicionais de
representação; o idealismo e a austeridade do protestantismo holandês; o viés
místico da teosofia, movimento do qual Piet Mondrian era membro.
Estética
A redução a formas elementares,
neutras, que por si só não provocam qualquer reação individual — as linhas
retas e cores primárias — nos leva a duas outras preocupações essenciais dos
teóricos do De Stijl: a ênfase estrutural e a necessidade vital do equilíbrio
assimétrico.
Para Mondrian, o "mais puro
de todos os membros" (na opinião de H.B. Chipp), "a beleza universal
não surge do caráter particular da forma, mas sim do ritmo dinâmico (…) das
relações mútuas das formas."
Rejeitando a simetria, os membros
do De Stijl procuravam então, através da combinação de linhas e ângulos retos,
um equilíbrio dinâmico que tocasse a "beleza universal", provocando a
emoção de beleza que, por sua própria característica, é "cósmica" e
"universal".
Pelo equilíbrio assimétrico,
entende-se o comportamento dos artistas em atribuir valores semelhantes a
combinações de linhas e cores diferentes, balanceando suas composições. Este
exercício quase matemático transforma a tela em um plano e transforma o
dualismo conteúdo-forma em uma unidade inseparável. A noção de unidade é
fundamental — as relações equilibradas devem ser a mais pura representação do
caráter universal da ordem, da harmonia e da unidade, características que
também estão presentes na mente (se focalizarmos nela, seremos capazes de ver a
unidade natural).
Este dualismo conteúdo-forma é
apenas um entre os vários dualismos tratados por Mondrian em seus escritos.
Para o pintor holandês, o Neo-Plasticismo tinha como missão reconciliar o dualismo
matéria-espírito, além de resolver o dualismo entre individual e coletivo,
resultado de uma visão artística onde a expressão pela arte deve refletir a
consciência temporal do homem e vice-versa.
Para Van Doesburg e Mondrian,
portanto, o De Stijl estaria cumprindo o papel de resolver o questionamento do
homem moderno e ilustrar o desenvolvimento da consciência do homem do
individual para o universal, a rejeição da ênfase no individualismo (o
Neo-Plasticismo seria, de certa forma, a primeira expressão artística puramente
plástica porque não aceitava a predominância da consciência individual). Nas
palavras de Van Doesburg:
"Aquilo que se expressa
positivamente na plasticidade moderna — uma proporção equilibrada do peculiar e
da generalidade — manifesta-se mais ou menos também na vida do homem moderno e
constitui a causa original da reconstrução social de que somos
testemunhas."
A composição, como forma
principal de expressão pela pintura, não renuncia ao elemento humano,
permitindo ao artista expressar sua subjetividade enquanto for necessário,
dando certa liberdade de escolha quanto à disposição dos elementos e do ritmo.
O que ocorre é a redução drástica dessa influência individual, aumentando
significativamente o caráter universal da obra.
Arquitetura
Vale ressaltar, como último ponto
fundamental da doutrina Neo-Plástica, a visão sintética das artes. Segundo a
análise de H.B. Chipp da ótica do movimento, "no futuro, a materialização
concreta dos valores pictóricos suplantará a arte. Então, já não precisaremos
de quadros, pois viveremos no meio da arte realizada."
Essa aproximação das artes
revela-se nitidamente na grande participação e influência de arquitetos no De
Stijl e no trabalho conjunto de Theo Van Doesburg, com muitos deles visando a
produção de um ambiente que fosse em si mesmo uma expressão artística.
Dentre as obras arquitetônicas do
De Stijl, a "Casa Schröder" projetada por Thomas Gerrit Rietveld
(1888-1964), artista extremamente fiel às premissas teóricas do movimento, é
uma das mais típicas — construída em Utrecht, em 1923-24, caracteriza-se pelo
uso de linhas retas, planos e cores básicas como elementos constitutivos,
"uma casa que se diria feita não para, e sim pelos moradores, utilizando
elementos pré-fabricados", abolindo elementos ornamentais, com superfícies
lisas, rejeitando a aparência rústica (conforme pregou Mondrian em sua obra
"Le Néo-plasticisme: principe général de l’équivalence plastique").
A preocupação estrutural, em
detrimento de quaisquer floreios ornamentais, expressa-se, portanto, não só na
pintura de Mondrian como na arquitetura dos adeptos do De Stijl. O racionalismo
de fundo místico, partindo da premissa de uma essência harmônica universal
(isto é, um conceito impessoal de Deus), opera em todos os níveis artísticos do
Neo-Plasticismo.
Influência Teosófica
O movimento teosófico, fundado
por Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891), alegava ter resolvido o conflito
entre espiritualidade e ciência (conflito evidenciado, principalmente, pela
teoria da evolução de Darwin) ao aplicar o conceito de evolução a uma escala
cósmica — todo o universo estaria evoluindo, não só as espécies, e nós
estaríamos vivendo sucessivas encarnações rumo à perfeição. A teosofia exerceu
grande influência no trabalho do matemático M.H.J. Schoenmaekers, especialmente
no tratado "Matemática Expressiva", que influenciou fortemente a
concepção artística de Piet Mondrian na fase inicial do Neo-Plasticismo.
Como resultado, o De Stijl era
visto por seus integrantes como mais do que um estilo artístico, possuindo um
caráter quase messiânico, sendo uma forma de filosofia e religião. Seus ideais
primários eram promover uma síntese místico-racional, uma busca pela ordem,
pela harmonia perfeita existente que poderia ser acessível ao homem (e à
sociedade) desde que este se subordinasse a ela. Trata-se, portanto, de uma
missão de caráter ético-espiritual, a tentativa de alcançar a "beleza
universal" citada por Mondrian.
Essa harmonia, essa ordem
perfeita e universal poderia ser alcançada, segundo os membros do De Stijl, com
a obediência às leis que regem a produção artística, que previam uma arte
não-figurativa pois, "como representação pura do espírito humano a arte
expressar-se-á numa forma esteticamente purificada, vale dizer, abstrata"
. Como tal, visando a expressão de um princípio universal, o Neoplasticismo
bania o individualismo excessivo (presente na arte figurativa) e reduzia a
pintura aos elementos constitutivos da linha, do espaço, da cor (segundo Theo
Van Doesburg, "o quadrado é para nós o que a cruz era para os antigos
cristãos"). Nas palavras do próprio Mondrian:
"Uma expressão individual
não se torna uma expressão universal por meio da representação figurativa, que
se baseia em nossa concepção do sentimento, seja clássica, romântica, religiosa
ou surrealista."
A arte não-figurativa, forma
encontrada para atingir a "expressão universal", não é, todavia,
fruto do inconsciente, do Id Freudiano, de lembranças individuais e pré-natais.
Esta forma de expressão artística é fruto da intuição pura, do pensamento puro,
embora tanto Mondrian quanto Van Doesburg admitam que os estímulos do mundo
exterior são indispensáveis, pois eles provocam o desejo de criação, o desejo
de tornar concreto (através da obra de arte) aquilo que só podemos sentir de
forma vaga e imprecisa, mas que é inerente à vida e subjacente à realidade
visível.
Um paralelo pode ser traçado
entre esse sentimento voltado para a essência, além da representação
figurativa, e o pensamento artístico de Platão — em certa medida, o De Stijl
corrobora o pensamento do filósofo grego acerca dos méritos da arte enquanto
cópia do mundo físico ("cópia da cópia", segundo Platão), colocando o
"mundo das idéias" (na visão do De Stijl, o princípio uno essencial
harmônico) como prioritário.
É importante ressaltar que os
participantes do De Stijl, em especial Piet Mondrian, não concebiam a arte
abstrata como sendo antagônica ou oposta à natureza. Para os artistas, a arte
abstrata opõe-se à natureza animal e primitiva do homem, uma natureza grosseira
que não corresponde à verdadeira natureza humana, encontrada nas leis
universais, na essência que os Neo-Plasticistas objetivavam alcançar.
De forma alternativa, a concepção
do De Stijl como uma tentativa de atingir o mundo como "Coisa-em-si"
também é justificável, embora uma ressalva importante tenha de ser feita —
enquanto Schopenhauer caracteriza o mundo como "Coisa-em-si" como
incognoscível e caótico, cuja única força motriz é a Vontade, os teóricos do
Neoplasticisimo afirmavam que esse estado, a "Coisa-em-si", era
dotado da mais perfeita harmonia e equilíbrio, podendo ser alcançado através de
um processo de ‘purificação’.
Fonte: Wikipédia
Nenhum comentário:
Postar um comentário