Para podermos fazer, portanto, a análise do
imponderável, necessitaríamos saber penetrar a estrutura de nosso próprio
destino, isto é, conhecer a fórmula de sua composição e a natureza e
percentagem de suas várias forças componentes. Precisaríamos de conhecer,
noutras palavras, o que preparamos em nosso longo passado. O homem atual não
tem conhecimento de nada disso e está longe de imaginar que tudo isso se possa
saber. E é bom que não o saiba, tão grande é sua tendência de fazer mau uso de
tudo. A divina sabedoria não nos permite o conhecimento senão proporcionalmente
ao que merecemos. Precisaríamos de poder pesar méritos e deméritos, medir e
qualificar as forças adquiridas, os impulsos negativos e contrários das culpas,
as falhas, os desvios, tanto quanto os esforços de ascensão, as retificações,
registrar todo o débito e crédito diante dos equilíbrios da divina justiça.
Necessitaríamos conhecer o homem em geral e seu caso particular. Trabalho de
profunda penetração no próprio destino, que cada um pode fazer sozinho,
estudando-se, reconstruindo-se, reconhecendo, pelo que é hoje, o que
necessariamente deve ter sido no passado, observando analiticamente o que seus
instintos, atualmente, resumem numa síntese, percorrendo de novo a estrada
seguida até chegar a ser o que hoje é, decompondo o produto atual em seus
vários elementos constitutivos. Determinado tudo isso, poderá ele dizer, então,
que probabilidade terá hoje de vencer ou perder, de regozijar-se ou sofrer, de
ser, como se diz, feliz ou desgraçado. Assim como para saber qual será nossa
saúde durante a vida, devemos conhecer o estado orgânico de nossos pais e avós,
assim, paralelamente à hereditariedade fisiológica, devemos, para conhecer
nosso destino, interrogar o nosso passado espiritual, a fim de estabelecer o
que dele nos provém, pela paralela lei de hereditariedade espiritual.
É fundamental, para prevermos o êxito desta
vida, conhecer seus precedentes, sua contabilidade no tempo, saber com que
fardo de débito ou crédito nascemos. Não se trata absolutamente de sorte, nem
de acaso, nem de habilidade apenas. Compreender, compreender, compreender - eis
o grande problema. O homem atual, porém, se ocupa de outras coisas. E, por
isso, a Lei o guia e o domina, sem que ele compreenda coisa alguma.
Que imensa bagagem de impulsos trazemos
conosco, como indivíduos e como coletividade! E isso em todos os campos: moral,
econômico, intelectual, orgânico, social. Cada abuso, em qualquer parte, gera
uma inversa carência, correspondente e proporcional. Por isso na Terra muitos
sofrem, necessitando de coisas que, no entanto, existem em abundância.
Cada desenvolvimento unilateral de uma
qualidade gera a necessidade de completar-se com outro desenvolvimento no lado
oposto, com experiências diametralmente contrárias. Por isso, neste mundo
muitos se encontram deslocados, justamente porque aqui se encontram para
experimentar e aprender o que ainda não sabem. Daí parecer, na Terra, estar
tudo errado. Este mundo, porém, não é lugar de repouso, mas de exercício, não é
campo para colher, e sim para semear.
Nossas deficiências morais, o crime, o
vício, a pobreza, a imbecilidade, como também as predisposições e
vulnerabilidades orgânicas, são carências resultantes de abusos. O panorama do
nosso mundo parece poder resumir-se em duas palavras: abuso e carência. Existe
de tudo, porém, mal distribuído. O abuso, saciando- nos, consome-nos,
enfraquece-nos, facilitando ataques patogênicos de toda espécie, em todos os
campos, e contra os quais não mais estamos premunidos, por havermos destruído
nossas defesas naturais. O mau uso inverte os impulsos da vida que, assim, não
mais permanecem conosco, mas, se põem contra nós. Qual é nosso passado humano?
A história nos diz que, muitas vezes, foi
horrendo. Que poderemos esperar da vida, com semelhante fardo nos ombros? Além
disso, o dinamismo íntimo da própria personalidade atrai as forças do ambiente,
torna-se núcleo, formando-se-lhe em torno vestimenta material de formas, em que
detemos nossa observação, e que dão solidez e resistência concreta ao
imponderável. Se isso nos parece hostil e a Terra um lugar de sofrimento,
também é verdade que este mundo pode ser um purgatório, lugar de redenção.
Se na Terra os involuídos podem até gozar e
os malvados se arruinam, entranhando-se sempre mais no mal, também é verdade
que os evoluídos aqui vêm para purificar-se ainda mais, através da dor e do
amor. Também é verdade que no purgatório terreno é oferecida a cada alma a
possibilidade de reconstruir-se no bem e de preparar para si mesma um futuro de
felicidade, corrigindo seu próprio destino através de uma vida santa.
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