O Movimento Antropofágico foi uma
manifestação artística brasileira da década de 1920, fundada e teorizada pelo
poeta paulista Oswald de Andrade.
O Manifesto Antropófago (ou
Manifesto Antropofágico) foi um Manifesto Literário escrito por Oswald de
Andrade, principal agitador cultural do início do Modernismo no Brasil. Foi
lido em 1928 para seus amigos na casa de Mário de Andrade e publicado na
Revista de Antropofagia, que ajudou a fundar com os amigos Raul Bopp e Antônio
de Alcântara Machado.Mais político que o anterior manifesto de Oswald, o da
Poesia Pau-Brasil, esteticamente, basicamente, reafirma os valores daquele,
apregoando o uso de uma "língua literária"
"não-catequizada".
Ideologicamente, se alinha ainda
com aquele, porém busca uma maior explicitação da aproximação de suas ideias
com as de André Breton e, portanto, com as ideias de Marx, Freud e Rousseau.A
Antropofagia, como movimento cultural, foi tematizada por Oswald nesse
manifesto, mas também reapareceu outras vezes em sua obra. Em Marco Zero I
(1943), romance de Oswald escrito sob influência do marxismo e da arte realista
mexicana, surgiu o personagem Jack de São Cristóvão, relembrando a antropofagia
e celebrando-a como uma saída para o problema de identidade brasileiro e mesmo
como antídoto contra o imperialismo.
Na maturidade, Oswald buscou
fundamentação filosófica para a antropofagia, ligando-a a Nietzsche, Engels,
Bachofen, Briffault e outros autores, tendo escrito a respeito até teses, como
a Decadência da Filosofia Messiânica, incluído em A Utopia Antropofágica e
outras utopias, lançado, como toda sua obra, pela editora Globo a partir dos
anos 80.
A Revista de Antropofagia teve
duas fases, ou "dentições", como queriam os seus participantes. De
maio de 1928 a fevereiro de 1929, com 10 números, dirigida por Raul Bopp e
Alcântara Machado, com uma ideologia ainda não totalmente definida e
antropofágica foi a primeira fase. Desta forma, contribuíram para a revista
autores de ideologias diferentes como Plínio Salgado, Mário de Andrade,
Guilherme de Almeida, Jorge de Lima, Carlos Drummond de Andrade, Manuel
Bandeira, Menotti del Picchia, Murilo Mendes, Augusto Meyer, Pedro Nava
(praticamente toda a linha de frente do modernismo brasileiro da época). Com
ideologia mais definida, a "segunda dentição", dirigida por Geraldo
Ferraz, teve 15 números publicados no "Diário de São Paulo", de 17 de
março de 1929 a 1 de agosto de 1929. Os "antropófagos" da segunda
fase foram: Oswald de Andrade, Raul Bopp, Geraldo Ferraz, Tarsila do Amaral e
Patrícia Galvão (Pagu).
Aprofundando a ideologia da
Poesia Pau-Brasil, que desejava criar uma poesia de exportação, o movimento
antropofágico brasileiro tinha por objetivo a deglutição (daí o caráter
metafórico da palavra "antropofágico") da cultura do outro externo,
como a norte americana e europeia e do outro interno, a cultura dos ameríndios,
dos afrodescendentes, dos eurodescendentes, dos descendentes de orientais, ou
seja, não se deve negar a cultura estrangeira, mas ela não deve ser imitada.
Foi certamente um dos marcos do modernismo brasileiro.
Há muitas teorias ligadas a esse
movimento, como o estudo totem e tabu de Sigmund Freud (1856 - 1939) Oswald de
Andrade ironizava em suas obras a submissão da elite brasileira aos países
desenvolvidos. Propunha a "Devoração cultural das técnicas importadas para
reelaborá-las com autonomia, convertendo-as em produto de exportação". Unindo
ao primitivismo brasileiro um certo primitivismo herdado de Breton (com
aproximação ao Marxismo) em um enfoque da psicanálise de Freud, Oswald iria
prosseguir aprofundando o seu pensamento neste sentido. Na maturidade, Oswald
buscou fundamentação filosófica para a antropofagia, ligando-a a Nietzsche,
Engels, Bachofen, Briffault e outros autores, tendo escrito a respeito até
teses, como a Decadência da Filosofia Messiânica.
Não se trata, no entanto, de mais
de um processo de assimilação harmoniosa e espontânea entre os dois pólos, como
de certa forma o autor pregava no Manifesto da Poesia Pau-Brasil de 1924. Agora
o primitivismo aparece como signo de deglutição crítica do outro, o moderno e
civilizado: "Tupy, or not tupy that is the question. (...) Só me interessa
o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago".1 Nesse sentido, o
mito, que é irracional, serve tanto para criticar a história do Brasil e as
consequências de seu passado colonial, quanto para estabelecer um horizonte
utópico, em que o matriarcado da comunidade primitiva substitui o sistema
burguês patriarcal: "Contra a realidade social, vestida e opressora,
cadastrada por Freud - a realidade sem complexos, sem loucura, sem
prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama".
Nota-se, da mesma forma, que não
se trata de se opor pura e simplesmente à civilização moderna industrial;
antes, Oswald acredita que são alguns dos benefícios proporcionados por ela que
tornam possíveis formas primitivas de existência. Por outro lado, somente o
pensamento antropofágico é capaz de distinguir os elementos positivos dessa
civilização, eliminando o que não interessa e promovendo, por fim, a
"Revolução Caraíba" e seu novo homem "bárbaro tecnizado":
"A idade de ouro anunciada pela América. A idade de ouro. E todas as girls".
Mediante a oposição de emblemas culturais e símbolos míticos, o autor reconta
de forma metafórica a história do Brasil: Padre Vieira, Anchieta, a Mãe dos
Gracos, a corte de D. João VI, a Moral da Cegonha surgem ao lado da potência
mítica de Jabuti, Guaraci, Jaci e da Cobra Grande. Na nova imagem forjada o
passado pré-cabralino é emparelhado com as utopias vanguardistas, pois "já
tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista" em nossa idade de
ouro.
Como o autor observa em
depoimento posterior, a antropofagia foi um "lancinante divisor de
águas" no modernismo brasileiro. Não apenas por causa do ato de
consciencialização que significa a "descida antropofágica" - o
deslocamento do objeto estético, ainda predominante na fase pau-brasil, para
discussões relacionadas com o sujeito social e coletivo - como também pelas
opiniões divergentes que gera e que é causa de futuros desentendimentos entre
os modernistas. Sem dúvida, o caráter assistemático e o estilo telegráfico
utilizados pelo escritor para dar forma a seu ideário antropofágico de certo
modo contribuem para a ocorrência de uma série de mal-entendidos. No entanto, a
multiplicidade de interpretações proporcionada pela justaposição de imagens e
conceitos é coerente com a aversão de Oswald de Andrade ao discurso
lógico-linear herdado da colonização européia. Sua trajetória artística indica
que há coerência na loucura antropofágica - e sentido em seu não-senso..
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